ENSINO ESPÍRITA
- VIGIAI E ORAI
Você já ouviu a expressão “Vigiai e Orai”? Essa é uma
velha conhecida mensagem bíblica. E, embora seja antiga, ainda continua atual. “Vigiai
e orai, para que não entreis em tentação; o espírito, na verdade, está pronto,
mas a carne é fraca.” Mateus 26.41; também encontrada em Marcos 14:37-38 e
Lucas 22:46. Essa frase de Jesus tem subjacente, ou seja, está implícita uma
sabedoria extraordinária, já não representa um simples preceito moral ou
religioso, mas passa com a doutrina espírita a ser entendido como lei. Sobre
esse tema, que nos induz a refletir sobre a precipitação diante das
circunstâncias, fomos buscar no livro “Almas em Desfile”, do Espírito Hilário
Silva, uma estória intitulada “Quinze Minutos”. Conta-nos assim o
autor espiritual: Aristeu Leite era antigo lidador da Doutrina Espírita;
assíduo cliente das sessões; dono de belas palestras; edificava
maravilhosamente os ouvintes; mantinha com veemência o culto do Evangelho no
lar; visitava, cada fim de semana, vários núcleos beneficentes. Naquela
sexta-feira foi para casa, exultante. Vivera um dia pleno de trabalho, coroado
à noite pela oração ao pé dos amigos. Entrou. Serviu-se de pequena porção de
leite e, logo após, dirigiu-se ao quarto de dormir, onde a esposa e as
filhinhas repousavam. Preparou-se para o sono. Sentia, porém, necessidade de
meditação e volitou à sala adjacente. Abriu pequeno volume e releu este trecho
“O cristão é testado, a cada instante, em sua fé, pelos acontecimentos naturais
do caminho. Por isso mesmo, a oração e a vigilância, recomendada pelo Divino
Mestre, constituem elementos indispensáveis para que estejamos serenos e
valorosos nas menores ações da vida. Em razão disso, confie na Providência
Maior, busque a benignidade e seja otimista. A caridade, acima de tudo, é
infatigável amor para todos os infelizes. Por ela encontraremos a porta de
nossa renovação espiritual. Acalme-se, pois, sejam quais forem as
circunstâncias e ajude os seres da Criação, na certeza de que estará ajudando a
si mesmo”. Aristeu fechou o livro, confortado, e refletiu: - Estou satisfeito;
vivi bem o meu dia; continuarei imperturbável; auxiliarei a todos; estou firme.
Louvado seja Deus! Sem dívida, sentia-se mais senhor de si; realizava-se. E, em
voo mais alto de superestimação do próprio valor, acreditou-se em elevado grau
de ascensão íntima. Nesse estado d'alma, proferiu breve oração e consultou o
despertador; uma e quinze da madrugada. Apagou a luz e recolheu-se. Penetrava
de leve os domínios do sono, quando acordou sobre-excitado. Alguém pressionava
de manso a porta. A esposa despertou trêmula. Aterrada, não conseguia sequer
falar. Aristeu, descontrolado, pode apenas balbuciar: Psiu! Psiu! Ladrão em
casa. Lembrou-se, num átimo, de antigo revolver carregado, em gaveta de seu
exclusivo conhecimento. Deslizou, à feição de gato. E porque o rumor
aumentasse, disparou dois tiros contra o suposto intruso. Dispunha-se a
continuar, quando voz carinhosa exclamou assustadiça: - Meu filho! Meu filho!
Sou eu, seu pai. Desfez-se o tremendo engano. O genitor do chefe da casa viera
de residência contigua. Possuindo as chaves domésticas, não vacilara, aflito,
em vir rogar ao filho socorro médico para a esposa acamada, com febre alta.
Algazarra; vizinhos em cena; meninas em choro de grande grito. Aristeu,
envergonhado, abraçava o pai, saído incólume, e explicava aos circunstantes o
acontecido. Enquanto revirava pequena farmácia familiar, procurando um
calmante, deu uma olhadela no relógio; uma e meia da manhã. Entre os votos
solenes e a ação intempestiva que praticara, havia somente o espaço de quinze
minutos.
Diante de tal texto, podemos fazer uma reflexão. O
objetivo deste estudo é buscar e manter o equilíbrio espiritual. Para tanto
devemos fazer uso dos verbos no imperativo, que se traduzem por uma ordem na
mudança de nossas atitudes e comportamentos. Vigilância, na sua expressão
correta, como nos ensina Jesus com o “vigiai e orai”, não é fiscalizarmos as
atitudes alheias, mas objetiva, acima de tudo, nos prevenir acerca de nossas
próprias imperfeições e falhas. As nossas fraquezas nos prendem à retaguarda
espiritual, induzindo-nos a ações menos edificantes que nos dificultam a marcha
evolutiva. Como espíritas, conhecedores do Evangelho à luz da Terceira
Revelação, grande é a nossa responsabilidade e, por isso, precisamos estar
vigilantes com relação aos nossos próprios atos, palavras e pensamentos, para
que externem sempre o que de melhor temos aprendido na doutrina. Vigiar os
pensamentos quer dizer mentalizar sempre o bem para todos os que nos cercam e
para toda a humanidade, evitando assim colaborar para o acréscimo das
ansiedades que envolvem tantas pessoas nos dias atuais. Vigiar ações, afim de
que sejamos sempre instrumentos úteis nas mãos da espiritualidade maior, no
auxílio aos necessitados. Vigiar será finalmente estarmos atentos para que não
venhamos a ser escravos de ilusões e imperfeições, transformando-nos em
verdadeiros espíritas que veem na existência terrena uma oportunidade gloriosa
de aprender, amar, ajudar e servir sempre, em nome de Jesus, em favor de nossa
própria felicidade espiritual.
Pelo desconhecimento de nossos sentimentos, tomamos,
algumas vezes, atitudes equivocadas que nos fazem sofrer muito.
Quantas vezes já não nos arrependemos por agirmos sem
pensar? Por falar sem querer? E estas situações ainda são as mais brandas.
Complicado fica controlar a tempestade de pensamentos que povoam nossa mente,
por todo o dia. Está aqui uma lição para todos nós; afinal de contas, nós,
muitas vezes, somos levados a proceder como o Aristeu da nossa estória, porque
estamos tão confiantes que não apercebemos de que muitas ciladas podem ser
interpostas em nosso caminho. Vigiai e orai! Podemos observar que Jesus colocou
o verbo VIGIAR antes do verbo ORAR , e tal ênfase
indica que somente a oração não basta, pois, também é a vigilância algo muito
necessário em nossas vidas. Vigiai e orai! Podemos dizer com muita certeza que
esses dois imperativos nos convoca permanentemente a demorada reflexão. O
alerta do Cristo há milênios ainda hoje ecoa de maneira atualíssima em nossa
caminhada. Realmente, necessitamos vigiar e, então, depois, orar. Precisamos
estar atentos a essas situações que nos desequilibram, e que nos levam, muitas
vezes, a ter atitudes que irão nos comprometer em várias existências, por
muitas encarnações. Vigiai e orai, para não cairdes em tentação! Para que
melhor possamos compreender o profundo alcance trazido pelo meigo Rabi da
Galileia, vamos analisar essa expressão por partes.
Por que devemos vigiar? Vigiar é praticar a auto-observação de instante em
instante, prestar a atenção nos pensamentos, sentimentos e atitudes. Existem
dois tipos de vicissitude; a de ordem material e a de ordem espiritual.
Com relação à matéria, devemos procurar identificar as
nossas tendências no sentido de eliminarmos o que há em nós de instintos
inferiores que acalentamos em nosso íntimo (orgulho, egoísmo, ira, mágoa,
culpa, vingança, etc.). Pois devemos ter presente que somos espíritos em
evolução, portadores de defeitos e virtudes que revelam a nossa essência. A
vigilância faz-se necessária, pois o quotidiano apresenta-nos constantemente
situações que nos sugestionam e condicionam. Não devemos esquecer que pelo ato
de pensar permutamos ideias, influenciamos e somos influenciados por mentes
afins, que tanto podem ser encarnados como desencarnados, que nos sugestionam a
fim de que lhes possamos satisfazer às suas vontades. Kardec ao desenvolver a
explicação da oração dominical, no capítulo XXVIII do Evangelho Segundo o
Espiritismo esclarece: “A causa do mal está em nós mesmos, e os maus espíritos
apenas se aproveitam de nossas tendências viciosas, nas quais nos entretém,
para nos tentarem. Cada imperfeição é uma porta aberta às suas influências,
enquanto eles são impotentes e renunciam a qualquer tentativa contra os seres
perfeitos. Tudo o que possamos fazer para afastá-los será inútil, se não lhes
opusermos uma vontade inquebrantável na prática do bem, com absoluta renúncia ao
mal. É, pois, contra nós mesmos que devemos dirigir os nossos esforço, e então
os maus espíritos se afastarão naturalmente, porque o mal é o que os atrai,
enquanto o bem os repele”.
Como podemos verificar, as tendências inferiores que
fazem parte do nosso patrimônio evolutivo, manifestam-se naturalmente, daí a
nossa necessidade da vigilância permanente das nossas tendências. Da mesma
forma como nosso grupo de amigos encarnados é formado por afinidades, nossos
companheiros espirituais também o são. Por isto, a importância do Vigiar. Se a
influência dos espíritos sobre nós é tão grande como descrita em O Livro dos
Espíritos, é melhor que estejamos cercados por aqueles capazes de nos das bons
conselhos e instruções.
Por que devemos orar?
Depois de feita a observação daquelas tendências inferiores em nós, que nos trazem
sofrimentos, façamos a segunda prática. No momento em que percebemos a atuação
dos “defeitos”, devemos orar para que seja retirado de nossa personalidade a
imperfeição observada. A oração é um ato através do qual nos colocamos em
sintonia permutando energias com as esferas superiores da vida, com entidades
do bem, sublimando sentimentos. Essa permuta de energias aproxima os
benfeitores espirituais que nos aconselham e ajudam a superar as nossas
fraquezas e, como sabemos, onde há espíritos do bem os espíritos maliciosos se
afastam, não podendo atuar sobre nós, uma vez que não lhes estamos dando campo
de sintonia para a sua influenciação. Conforme nos explica Kardec, no capítulo
XXVII do Evangelho Segundo o Espiritismo, item 7, o que Deus nos concederá
sempre, se pedirmos com fé é: A coragem, a paciência e a resignação. Também nos
concederá os meios de nos livrarmos, por nós mesmos, das dificuldades, mediante
ideias que nos serão sugeridas pelos bons Espíritos, de maneira que nos restará
o mérito da ação. Deus assiste aos que ajudam a si mesmo segundo a máxima:
“Ajuda-te e o céu te ajudará”, e não aos que tudo esperam do socorro alheio,
sem usar as próprias faculdades. Como verificamos, somos regidos por leis de
sintonia; permutamos energias com os encarnados e desencarnados. De acordo com
os nossos sentimentos e com as nossas aspirações teremos ao nosso redor
entidades que nutrem os mesmos valores. A cada momento da vida vamos nos
deparar com situações que ensinam, que testam, que colocam à prova nossa
constância de propósitos e a nossa fé. Jesus, orientando os Seus seguidores,
conhecedor profundo da natureza de cada um, recomendava vigilância e oração
como elementos indispensáveis na batalha entre o homem velho e o homem novo.
Recomendava fé, confiança na Providência divina, otimismo na caminhada, como
postura essencial para aqueles que O seguiam, passes obrigatórios no pedágio da
estrada de iluminação espiritual. Recomendava calma diante das circunstâncias;
discernimento das situações vividas, uma vez que toda precipitação é danosa, e
escurece as opções do caminho. Que Jesus nos auxilie a vigiar e a orar, para
que possamos corrigir o nosso comportamento danoso, em virtude da nossa visão
estreita, ao nosso semelhante, e para que possamos, cada vez mais, crescermos
espiritualmente, cumprindo com nossos compromissos assumidos de forma
voluntária.
Muita Paz!