O mês de outubro, para nós, espíritas, é considerado como o “Mês de
Kardec”. Você sabe quem foi Hippolyte Léon Denizard Rivail? E Allan Kardec?
Podemos afirmar que trata-se do Codificador da Doutrina Espírita. Nós,
espíritas, devemos perguntar: que Espírito é esse que foi capaz de fazer a
integração, pela primeira vez na História da Humanidade, da Ciência com a
Filosofia e com a Religião? Que Espírito é esse que conseguiu fazer com
que todas as questões da transcendência humana pudessem ser equacionadas,
compreendidas, racionalizadas e, melhor ainda, trouxessem uma experiência para
uma vida nova, para que a felicidade de fato pudesse vir a ser alcançada? Não
mais aquelas histórias antigas que não falam à inteligência das pessoas; não
mais as crendices, mas alguma coisa que fala à inteligência do ser, ao
sentimento do ser, ao amor do ser, à luz do ser, e fala ao ser.
Que Espírito é esse capaz de traduzir com
tanta clareza, com tanta objetividade esses conceitos, que são os mais
profundos que o ser humano pode recolher, e colocando essa conceituação de
maneira tão precisa? Que Espírito é esse que, afinal de contas, faz com que nós
tenhamos um tempo novo, uma revelação nova, nos tempos novos que começam a
aparecer? Às vezes, nós pensamos que, lá no Plano Espiritual, os Mentores
preparam e enviam o missionário prontinho. Mas não é dessa maneira. Os grandes
missionários da Humanidade se fizeram aqui na Terra, à custa de muito esforço e
de muito trabalho. Eles se aprontam em meio à grandes dificuldades.
Hippolyte Léon Denizard Rivail não veio
pronto, tanto isso é verdade que, ao questionar os Espíritos, temendo falhar na
sua missão, estes responderam: “Se você falhar, nós incumbiremos outra pessoa
para essa missão”. (Nessa metade de século, o homem fez várias descobertas.
Para ele tudo era matéria. E, por isso, a
Espiritualidade resolveu aparecer, para dizer que não era bem assim). Então,
para o professor Rivail, não houve uma fatalidade programada ao sair do Plano
Espiritual. Livre-arbítrio e esforço contavam na carreira desse homem, que
viria a ser o Codificador do Espiritismo. Isso o torna importante e a sua
missão mais importante ainda.
Segundo Herculano Pires, Pestalozzi foi fundamental
na formação intelectual e moral daquele que viria a ser Allan Kardec, para que
a Codificação tomasse o rumo que tomou. De quatorze para quinze anos de idade,
o jovem Rivail já era assistente de Pestalozzi. Dava aulas para os alunos mais
atrasados. Dominava todas as trinta e quatro disciplinas com excepcional
proveito. Falava seis idiomas. Podemos imaginar, então, que trabalho não houve
do lado de lá para que Hippolyte pudesse do lado de cá manter acesa a paixão
pelo estudo, quando, normalmente, os jovens nessa idade estavam se divertindo.
Em 1822, com dezoito anos, ele se gradua no Instituto de Yverdun e volta para
Paris.
Em 1824, com vinte anos, era diretor de uma
escola. Escrevia o seu primeiro livro, uma gramática da língua francesa.
Escrevia também um apêndice de Aritmética e Álgebra, para uso dos professores
primários e mães de família. Durante trinta anos, o professor Rivail se dedica
ao magistério. Nesse período escreve trinta e duas obras. Era respeitado em
toda a Europa. Em 1848 a Espiritualidade começa a promover um verdadeiro
escândalo em Hydesville, com as irmãs Fox, com o episódio das batidas, que
todos nós já ouvimos falar, e que chamou a atenção para alguma coisa além da
matéria. Aí, começou o intercâmbio entre os homens e o mundo espiritual, que
vai gerar a Codificação.
Em 1854 Rivail contava cinquenta e um anos de
idade quando ouviu, pela primeira vez, falar das mesas girantes. Eram mesas que
se erguiam do solo, e davam pancadas no chão, com uma ou mais pernas, fenômenos
mediúnicos, que serviam como passatempo. De início, ele foi cético, parecia-lhe
absurdo atribuir inteligência a uma coisa puramente material. Homem criterioso,
não se deixava levar por modismos. Só, que, a coisa toma vulto, e só se fala
nisso. Em maio de 1855 encontrou-se com o Sr. Pâtier e a Sra. Plainemaison, que
lhe falaram sobre as mesas girantes, mas, agora em outro tom, instrutivo e
sério. Conheceu a família Baudin, ocasião em que o Sr. Baudin o convidou para
assistir às sessões que aconteciam em sua casa. Surgiu, então, uma oportunidade
para estudar e observar mais atentamente as causas geradoras desses fenômenos.
Somente ele, Rivail, para perceber a utilidade do novo “modismo”, substituindo
a atração frívola e passageira, calcada nas respostas de espíritos brincalhões,
por uma investigação séria, capaz de descortinar, para o homem, as verdades que
ele próprio, por sua condição investigativa precária, ainda não podia conceber.
E através de duas médiuns, filhas do Sr. Baudin, toma contato direto com esses
fenômenos e desperta para a sua missão. Começa um estudo e desenvolve os
primeiros trabalhos importantes sobre o assunto, que vai lhe tomar mais de vinte horas
diárias.
Entregou-se
à observações perseverantes sobre os fenômenos, e se empenhou
principalmente em deduzir-lhes as consequências filosóficas. Se até então as
sessões na casa do Sr. Baudin não tinham um objetivo determinado, Rivail, pelo
seu jeito professoral e questionador, mudou naturalmente essa situação, pois,
nessas entrevistas com os espíritos, antes frívolas, agora se procurava
resolver problemas importantes e de grande interesse, sob o ponto de vista da
Filosofia, da Psicologia e da natureza do mundo invisível.
Kardec ia a cada reunião com uma série de
perguntas preparadas e metodicamente dispostas, às quais os espíritos lhe
respondiam com precisão, profundidade e lógica. A disposição adotada por Rivail
em seus estudos espíritas foi sempre seguir a seguinte regra: observar,
comparar e deduzir. Todas as informações foram obtidas pela escrita, por
intermédio de diversos médiuns. Os primeiros médiuns que concorreram para a
elaboração desse livro foram as Srtas. Baudin. Quase todo o livro foi escrito
por intermédio delas, em presença de numeroso público que assistia às sessões,
com o mais vivo interesse. As médiuns ficavam sentadas separadamente e faziam a
mesma pergunta aos espíritos. É, aí, que entra o espírito científico de Rivail.
Coteja as questões, recusa aquilo que parece dúbio (Pode se recusar dez
aparentes verdades, em vez de se aceitar uma possível mentira). E Rivail se
dedica durante dezessete meses consecutivos à Codificação da Doutrina. Reúne as
questões que os médiuns receberam dos Espíritos, examina a coerência de suas
comunicações e o teor de sua linguagem. Em 25 de março de 1856, através da
médium Srta. Baudin, Rivail teve pela primeira vez contato com seu guia
espiritual. Como o trabalho estava quase terminado, pronto para a edição, ele
resolveu revê-lo, entrevistando outros Espíritos, mediante outros médiuns.
Nesse trabalho de revisão, mais de dez médiuns lhe prestaram assistência. Assim
se formou a primeira edição de O Livro dos Espíritos, com 501 perguntas e
respostas, assim colocadas: perguntas numa coluna, respostas em outra coluna ao
lado, que apareceria para o público a 18 de abril de 1857.
Por ocasião do lançamento da primeira edição
de O Livro dos Espíritos, Rivail viu-se às voltas com uma dúvida, diz ele: Essa
obra que vem a público tem que falar por si mesma. O professor Rivail precisa
desaparecer, ele não pode sustentar essa obra, porque as pessoas vão
valorizá-la por aquilo que é o professor, e eu quero que ela se valorize por
aquilo que ela é, pela riqueza que tem. Zéfiro, guia espiritual da família
Baudin, sugere um nome gaulês, que Rivail teria usado numa de suas
reencarnações, “Allan Kardec”, e ele acha de bom proveito utilizá-lo. E é com
esse pseudônimo que passa a assinar todas as suas obras espíritas. Que homem
mais preparado do que esse para codificar a Doutrina Espírita? O homem é menos
importante que a obra, mas é importante que se conheça o homem para que se
valorize a obra. O homem engrandece a obra quando é grande também. E o
professor Rivail agigantou-se no mundo. Esse é Hippolyte Léon Denizard Rivail,
um homem que viveu de 1804 a 1857, exatamente cinquenta e três anos; Allan
Kardec viveu somente doze anos. São dois personagens que nós precisamos
separar, e que o próprio professor Rivail fez questão de apartar. A primeira
edição de O Livro dos Espíritos já sai com o nome desse homem que nasce
exatamente em abril de 1857, Allan Kardec. Desaparece o professor Rivail e
surge o codificador do Espiritismo.
Agora, como é que esse homem fez a codificação? Codificar significa organizar, colocar em uma disposição didática. Kardec sabia escrever muito bem, tinha prática de montar didaticamente um livro, para que oferecesse ao leitor uma maneira mais fácil de entendimento. Kardec organiza a Doutrina Espírita usando a Maiêutica, método inventado por Sócrates para tornar o conhecimento mais fácil, o sistema de perguntas e respostas, que quebra o conhecimento em porções menores e permite que o leitor, que o estudioso, absorva o conhecimento aos poucos, inclusive com interrupções, sem que signifique prejuízo para o conhecimento. Allan Kardec, a partir do instante em que chega à luz O Livro dos Espíritos, vai começar a experimentar uma vida de calvário, de perseguições. Vai ser alvo de mentiras e calúnias pela imprensa, que era dominada, nessa época, pela Igreja Católica, feroz combatente do Espiritismo que nascia ali, em Paris, cidade luz, berço da cultura mundial. Nesses primeiros tempos, só ataques a Kardec. Tentam inclusive desvalorizar a obra dele como professor, acusando-o de loucura. Como não poderia deixar de ser, O Livro dos Espíritos encontra na França ferozes combatentes. A editora que o publica não recebe mais encomendas. Não se pense que a Espiritualidade colocou um anteparo a frente dele e facilitou tudo.
Kardec foi combatido até o final de sua vida.
De 1857 a 1869 foi uma vida de sacrifícios inimagináveis, contra tudo e contra
todos. Ataques de todos os tipos, não apenas à obra, mas a ele. A segunda
edição de O Livro dos Espíritos foi inteiramente refundida e consideravelmente
aumentada, com ampla revisão, mediante o contato com grupos espíritas de cerca
de quinze países da Europa e das Américas, lançada em 16 de março de 1860,
agora com 1018 perguntas e respostas. Essa obra chega-nos às mãos hoje trazendo
para as criaturas notícias de que a vida não para no túmulo, que ela exatamente
recomeça no túmulo. Esses foram alguns episódios da vida de um homem chamado
Hippolyte Léon Denizard Rivail. Por isto e tudo mais, nosso grande preito de
gratidão em relação ao seu criterioso trabalho. E que esse livro seja para a
Humanidade o Consolador prometido.
Muita Paz!
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