A Escolha das
provas
Um dos
princípios da Doutrina Espírita é a reencarnação, entendida pelos orientadores
espirituais como necessária à evolução humana, pois uma só existência corpórea
é claramente insuficiente para que o Espírito possa adquirir todo o bem que lhe
falta e de desfazer de todo o mal que traz em si. Para nos auxiliar no processo
ascensional, Deus nos concede o livre arbítrio, uma vez que, se o homem tem
liberdade de pensar, tem também a de agir. Podemos, então, afirmar que o ser
humano é o árbitro do seu destino e que cada escolha, independentemente das
suas motivações ou justificativas, acionam a lei de causa e efeito em qualquer
plano de vida que se situe: o físico ou o espiritual. O uso do livre arbítrio
provoca reações, no tempo e no espaço. As boas escolhas produzem progresso
evolutivo, enquanto as escolhas infelizes geram provações ou expiações que se
configuram como mecanismos evolutivos, moduladores da lei de causa e efeito,
claramente consubstanciada no planejamento reencarnatório de cada indivíduo.
Para melhor compreensão do assunto, vamos especificar a diferença que há entre
prova e expiação: Mas, qual é o significado de prova? Pelo dicionário espírita
L. Palhano Jr., encontramos: “situação aflitiva que atesta a capacidade do
indivíduo para superar as próprias imperfeições morais”. Nós temos imperfeições
morais? Temos! Todos nós temos imperfeições morais. A provação ou prova, é a
batalha que nos ensina o trabalho, a nossa edificação espiritual. A expiação é
uma pena que nos é imposta, por algo de errado que cometemos. Percebe-se,
portanto, que a prova se assemelha a uma corrida de obstáculos que tem o poder
de impulsionar o progresso humano. As provas sempre existirão, por se tratarem
de desafios evolutivos. A expiação,
contudo, representa uma contenção temporária da liberdade individual,
necessária à reeducação do Espírito que, melhor utilizando o livre arbítrio,
reajusta-se às determinações das leis divinas. As provações podem ser difíceis,
não resta dúvida, mas, por seu intermédio, o Espírito é colocado em situações
que o afasta do estado de inércia em que ora permanece ou se compraz,
proporcionando-lhe, ao mesmo tempo, oportunidades para que ele possa trabalhar
a melhoria das suas atuais condições de vida. Vejamos a Questão 258 do Livro
dos Espíritos. No estado errante, antes de nova existência corpórea, o Espírito
tem consciência e previsão do que lhe vai acontecer durante a vida? E os
Espíritos responderam: “Ele mesmo escolhe o gênero de provas que deseja sofrer;
nisto consiste o seu livre-arbítrio”. Questão 259. Se o Espírito escolhe o
gênero de provas que deve sofrer, todas as tribulações da vida foram previstas
e escolhidas por nós? Responderam os Espíritos: “Todas, não, pois não se pode
dizer que escolhestes e previstes tudo o que vos acontece no mundo, até as
menores coisas. Escolhestes o gênero de provas; os detalhes são consequências
da posição escolhida, e frequentemente de vossas próprias ações. Se o Espírito
quis nascer entre malfeitores, por exemplo, já sabia a que deslizes se expunha,
mas não conhecia cada um dos atos que praticaria; esses atos são produtos de
sua vontade ou do seu livre-arbítrio. O Espírito sabe que, escolhendo esse
caminho, terá de passar por esse gênero de lutas; e sabe de que natureza são as
vicissitudes que irá encontrar; mas não sabe quais os acontecimentos que o
aguardam. Os detalhes nascem das circunstâncias e da força das coisas. Só os
grandes acontecimentos, aqueles que influem no destino, estão previstos. Se
tomas um caminho cheio de desvios, sabes que deves ter muitas precauções,
porque corres o perigo de cair, mas não sabes quando cairás, e pode ser que nem
caias, se fores bastante prudente. Se, ao passar pela rua, uma telha te cair na
cabeça, não penses que estava escrito, como vulgarmente se diz. Questão 262. Como pode o Espírito que, em sua
origem, é simples, ignorante e sem experiência escolher uma existência com
conhecimento de causa e ser responsável pela sua escolha? Responderam os
Espíritos: “Deus supre a sua inexperiência, traçando-lhe o caminho que deve seguir,
como fazes com uma criança desde o berço. Mas deixa-lhe pouco a pouco a
liberdade de escolher, à medida que o seu livre-arbítrio se desenvolve. E então
que ele muitas vezes se extravia, tomando o mau caminho, por não ouvir os
conselhos dos bons Espíritos. É a isso que podemos chamar a queda do homem”. Se
na vida terrena escolhemos muitas vezes as provas mais difíceis, com vistas a
um fim mais elevado, por que o Espírito, que vê mais longe, e para quem a vida
no corpo é apenas um incidente fugaz, não escolherá uma existência penosa e
laboriosa, se ela o deve conduzir a uma felicidade eterna? Questão 266 de O
Livro dos Espíritos: Não parece natural que os espíritos escolham as provas
menos dolorosas? Responderam os Espíritos: Para vós, sim; para o Espírito, não.
Quando ele está liberto da matéria, a ilusão cessa e a sua maneira de pensar é
diferente. O homem, submetido na Terra à influência das ideias carnais, só vê
nas provas o lado penoso. É por isso que lhe parece natural escolher as provas
que, do seu ponto de vista, podem substituir com os prazeres materiais. Mas na vida espiritual ele compara os
prazeres fugitivos e grosseiros com a felicidade inalterável que entrevê, e
então, que lhe importam alguns sofrimentos passageiros? O espírito pode
escolher a prova mais rude, e em consequência a existência mais penosa, com a
esperança de chegar mais depressa a um estado melhor. Como o doente escolhe
muitas vezes o remédio mais desagradável, para se curar rapidamente. Aquele que
deseja ligar o seu nome à descoberta de um país desconhecido, não escolhe um
caminho coberto de flores, pois sabe os perigos que corre, mas sabe também a
glória que o espera, se for feliz. A doutrina da liberdade de escolha das
nossas existências, e das provas que devemos sofrer, deixa de parecer
extraordinária, quando se considera que os espíritos, libertos da matéria,
apreciam as coisas de maneira diferente da nossa. Depois de cada existência,
veem o progresso que fizeram e compreendem quanto ainda lhes falta em pureza,
para a atingirem. Eis porque se submetem voluntariamente a todas as
vicissitudes da vida corpórea, pedindo eles mesmos aquelas que podem fazê-los
chegar mais depressa. Não há, pois, motivo para nos admirarmos de que o
espírito não dê preferência à existência mais suave. No seu estado de
imperfeição, ele não pode desfrutar a vida sem amarguras, que apenas entrevê. E
é para atingi-la que procura melhorar-se. Não vemos diariamente exemplos de
coisas parecidas? O homem que trabalha uma parte de sua vida, sem tréguas nem
descanso, a fim de ajuntar o necessário para seu bem-estar, não desempenha uma
tarefa que se impôs, com vistas a um futuro melhor? O militar que se oferece
para uma missão perigosa, o viajante que não enfrenta menores perigos, no
interesse da ciência ou de sua própria fortuna, não se submetem a provas
voluntárias, que devem proporcionar-lhes honra e proveito, se as vencerem? A
que o homem não se submete e não se expõe, pelo seu interesse ou pela sua
glória? Todos os concursos não são provas voluntárias para melhorar na carreira
escolhida? Não se chega a nenhuma posição social de elevada importância, nas
ciências, nas artes, na indústria, sem passar pela série de posições
inferiores, que são tantas outras provas. A vida humana é assim o decalque da
vida espiritual. Nela encontramos, em menor escala, todas as peripécias
daquela. Aqueles que dizem que, se pudessem escolher a sua existência, teriam
pedido a de príncipes ou milionários, são como os míopes que não veem o que
tocam, ou como as crianças gulosas, que respondem, quando perguntamos que
profissão preferem: pasteleiros ou confeiteiros; da mesma maneira, o viajante,
no fundo de um vale nevoento, não vê a extensão nem os pontos extremos da sua
rota; mas, chegando ao cume da montanha, seu olhar abrange o caminho percorrido
e o que falta a percorrer, vê o final de sua viagem, os obstáculos que ainda
tem de vencer, e pode então escolher com mais segurança os meios de o atingir.
O espírito encarnado é como o viajante no fundo do vale; desembaraçado dos
liames terrestres, é como o que atingiu o cume. Para o viajante, o fim é o
repouso após a fadiga; para o espírito é a felicidade suprema, após as
tribulações e as provas. Todos os espíritos dizem que, no estado errante,
buscam, estudam, observam, para fazerem suas escolhas. Não temos um exemplo
disso na vida corpórea? Não buscamos muitas vezes, através dos anos, a carreira
que livremente acabamos por escolher, porque a achamos a mais apropriada a
nossos objetivos? Se fracassamos numa, procuramos por outra. Cada carreira que
abraçamos é uma fase, um período da vida. Não empregamos cada dia em escolher o
que faremos no outro? Ora, o que são as diferentes existências corpóreas para o
espírito, senão fases, períodos, dias da sua vida espírita que, como sabemos, é
a vida normal, não sendo a vida corpórea mais do que transitória, passageira?
Muita Paz!
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